Opinião | O uso da máquina pública para calar jornalistas: um ataque à democracia

Em um Estado democrático, o jornalismo cumpre a função essencial de fiscalizar o poder.

Publicado: 21/05/2025

FOTO: REPRODUÇÃO

O Brasil vive um momento em que a democracia está sendo posta à prova não apenas nos palanques ou nos gabinetes, mas também nos tribunais. A prática de autoridades públicas utilizarem a estrutura do Estado para processar jornalistas é um dos mais graves sinais de um poder que não tolera a crítica e busca, pela via judicial, sufocar o jornalismo independente.

Quando uma autoridade pública, com todas as prerrogativas, salários, assessorias jurídicas e institucionais que o cargo lhe confere, decide acionar judicialmente um jornalista, há um evidente desequilíbrio de forças. Não se trata de um cidadão comum, mas de alguém que detém poder e influência, valendo-se muitas vezes da máquina pública — advogados pagos com recursos públicos, assessorias e aparato estatal — para perseguir quem ousa exercer a liberdade de imprensa.

Esses processos, muitas vezes por supostos danos morais, não buscam reparar uma injustiça real, mas instaurar um ambiente de medo e autocensura. São ações intimidatórias, que impõem ao jornalista o custo financeiro e emocional de se defender, além da estigmatização profissional. O objetivo é claro: silenciar a crítica, dissuadir investigações e blindar autoridades de qualquer forma de escrutínio público.

Em um Estado democrático, o jornalismo cumpre a função essencial de fiscalizar o poder. A Constituição de 1988 é cristalina ao garantir a liberdade de expressão e de imprensa, vedando qualquer forma de censura prévia. Quando autoridades se utilizam de processos judiciais como instrumento de retaliação, corrompem a função pública e comprometem o direito fundamental da sociedade à informação.

Não se trata de afirmar que jornalistas estão acima da lei ou que não devem responder por eventuais excessos. Mas o caminho para contestar informações inverídicas é o contraditório público, o direito de resposta e, em último caso, o processo, desde que proporcional e necessário — jamais como ferramenta sistemática de coerção.

O Brasil ocupa posições preocupantes nos rankings internacionais de liberdade de imprensa. Casos recentes de assédio judicial a jornalistas, muitas vezes movidos por políticos que se dizem democratas, revelam um quadro alarmante. O Judiciário, por sua vez, precisa atuar com rigor e responsabilidade, coibindo o uso abusivo de ações judiciais como forma de silenciamento.

A sociedade civil, as entidades de defesa do jornalismo e cada cidadão comprometido com a democracia devem estar atentos: quando um jornalista é processado injustamente por revelar fatos de interesse público, não é apenas ele que está sob ataque, mas todos nós.

A liberdade de imprensa não é um favor que autoridades concedem. É um direito conquistado, que precisa ser permanentemente defendido, sobretudo contra aqueles que, investidos de poder, tentam instrumentalizar o Estado para proteger a própria imagem, mesmo que isso custe a verdade.

Paolloh Oliver é jornalista político, especializado na cobertura de instituições públicas e direitos democráticos.

Por Paolloh Oliver, jornalista político

COMPARTILHE AGORA

OUTRAS NOTÍCIAS

Rolar para o topo